Por Melissa Cannabrava
Jornalista no Museu da Vida e do Voz das Comunidades.
"Tá ligado no coronavírus deixa eu te passar a visão / essa doença triste que afetou nosso mundão / vamos ter consciência e fazer a nossa parte / fazer toda a prevenção pra nossa comunidade": estes são versos que tocam em carros de som pelas ruas da Cidade de Deus, Complexo do Alemão, Maré e outras comunidades da cidade. Sempre trazendo a mesma orientação, mas com mensagens transmitidas de maneira singular, a periferia começou a entender a importância de evitar aglomerações, ficar em casa e lavar as mãos com frequência.
Além de direcionamentos, as palavras “pandemia”, “isolamento social” e “lockdown” são algumas das que estampam os noticiários de todo o mundo desde o início do ano, junto com um amontoado de novos termos científicos difíceis para muita gente. Enquanto os governos de cada país buscavam estratégias para evitar que a pandemia se alastrasse ainda mais, a imprensa divulgava informações sobre a doença. Em meados de março, não era difícil encontrar pessoas que não faziam a menor ideia do que significava lockdown, e muitos ainda não sabem. Aqui no Brasil, palavras como “bloqueio total” e “confinamento” foram as substitutas para facilitar o entendimento da população sobre a importância do distanciamento.
Nas áreas com menos recursos do país, como em favelas e comunidades, há uma grande lacuna entre a ciência e a divulgação científica jornalística. Uma das principais barreiras é a linguagem que chega a esses territórios. Veículos de comunicação comunitária, ONGs, ativistas, associações de moradores e pessoas da área da saúde se sentiram responsáveis de cumprir com zelo a missão de contextualizar e explicar as informações para o público da periferia, mostrando que é muito mais do que uma gripe, como dizem por aí. É, sim, uma doença altamente contagiosa que causa graves problemas na saúde e em alguns casos pode levar à morte.
Informando e mobilizando, o Favelas Contra o Coronavírus (FCC), por exemplo, foi uma iniciativa que surgiu a partir de uma ideia de coletivos de comunicadores populares e coletivos de favelas do Rio de Janeiro. A intenção era informar sobre a Covid-19 de uma maneira mais simples, e com apoio de especialistas da Fiocruz. Foi possível investir em conteúdo visual com estratégias, utilizando uma linguagem que se encaixa no entendimento do morador.
Essas iniciativas a partir da comunicação comunitária passaram a ser extremamente necessárias em territórios onde a ciência é entendida apenas como forma de remediar. Além das aulas de ciência nas escolas, parte da população que mora em áreas que não são priorizadas pelo poder público só tem o primeiro contato com um pesquisador, na prática, ao buscar serviços nas redes de saúde do SUS, durante atendimento médico emergencial na UPA ou na Clínica da Família. Nesses espaços, acontece a troca com os agentes de saúde, que acabam atuando como divulgadores científicos nas comunidades.
Na periferia, a informação e as recomendações de prevenção chegam por meio de caixas de som instaladas em postes, faixas, folhetos e voluntários que levam o conhecimento científico da doença de porta em porta, tomando todos os cuidados recomendados pela OMS.
Entender a melhor maneira de comunicar e divulgar informações para o combate à Covid-19 nesses territórios é tão importante quanto as pesquisas científicas que são feitas para testar medicamentos ou produzir vacina.
Fica o convite para ouvir o chamado da perifa!
A FAVELA ESTÁ PASSANDO A MENSAGEM! Então pega a visão, porque se “eles lá” não fazem nada, faremos tudo daqui! ✨#COVID19NasFavelas #CoronaNasPeriferias pic.twitter.com/mlOWRteHct
— Santiago, Raull (de ?)? (@raullsantiago) March 19, 2020