Shitala Mata, deusa indiana da varíola
Material: mármore
Autor: desconhecido
Local: Índia
Dimensões: 32 x 21 x 9 cm
O objeto em foco deste mês é dedicado à escultura de Shitala Mata, deusa indiana da varíola. Ela, segundo a mitologia hindu, seria dotada de poderes causadores e curativos da doença.
Em algumas culturas, a mitologia é utilizada para explicar fenômenos naturais, disputas políticas e até mesmo o surgimento de algumas doenças. Como neste sistema de crença a vida é controlada por poderes divinos, as doenças são geralmente interpretadas como uma resposta punitiva ou manifestação da ira de alguma divindade.
Shitala Mata faz parte da crença popular indiana para explicar o surgimento da varíola e de outras doenças infecciosas como o sarampo. Segundo o Skanda Purana – escritura sagrada hindu –, Shitala surgiu através do fogo sacrificial, em homenagem ao deus Brahma, feito por um príncipe que desejava ser abençoado com um filho. Em vez de atender seu pedido, Brahma fez surgir do fogo uma linda donzela. Brahma assegurou que Shitala seria adorada pelos seres humanos desde que carregasse consigo as sementes de urad – uma espécie de grama negra com poderes especiais.
Shiva – um dos deuses supremos do hinduísmo, ao lado de Brahma e Vishnu – ofereceu Jvarasura, demônio da febre, como companheiro de Shitala. Com esta união, as sementes carregadas por ela se converteram em germes de varíola. Todos aqueles que recebiam a visita de Shitala – montada em um animal de carga, levando nas mãos uma pequena tigela e uma vassoura de prata – passariam a sofrer de febre e varíola. Afetados pela doença, os deuses pediram misericórdia e prometeram adoração desde que a deusa descesse à terra e levasse os germes com ela.
Ao descer à terra, Shitala Mata exigiu adoração ao rei Birat, que a negou por ser devoto fiel de Shiva. Como punição, a deusa usou seu poder de infligir a varíola espalhando setenta e cinco tipos diferentes da doença. Somente após se instaurar uma epidemia generalizada, tendo muitas mortes como consequência, Birat cedeu e permitiu que seus súditos passassem a adorá-la. Como acontece com todos que reconhecem a sua supremacia, a saúde restaurou-se milagrosamente.
Como a crença em Shitala Mata engloba a doença e a cura, as pessoas que desejavam se ver livres da varíola deveriam seguir um ritual de purificação em suas residências, que incluía a limpeza do ambiente, pois a deusa varre e coleta todos os germes em sua tigela. Uma vez que a sujeira é o berço de grande parte das doenças, o culto à divindade enfatiza a importância da higiene e a motivação para manter o ambiente limpo.
Apesar da narrativa mitológica, o culto à deusa da varíola permite compreender o temor em torno da doença infectocontagiosa que causava, além de erupções na pele, febre e hemorragias que levavam muitas pessoas à morte.
A escultura, nosso objeto em foco, foi adquirida pelo médico sanitarista Claudio do Amaral Júnior, que atuou na Índia e na Etiópia como consultor nas campanhas de erradicação da doença realizadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) na década de 1970. Estas campanhas, apesar de intensa mobilização e esforço internacional, enfrentaram muitas resistências.
O culto à Shitala Mata na Índia exigiu criatividade às equipes de saúde. Como a doença era interpretada como um símbolo de benção ou maldição, era um verdadeiro sacrilégio recusar a graça da deusa fazendo-se vacinar. Outro sério impeditivo cultural era o imunizante produzido a partir da substância vacinal retirada de vacas, animal sagrado para os indianos. Mas, com imaginação e criatividade, os vacinadores contornaram a difícil situação: a vacina era feita de varíola e, portanto, quem se imunizasse estaria contaminado com a doença, sendo abençoado pela deusa.
A partir de 1975, a Índia não registrou mais casos de varíola. A moléstia foi declarada extinta pela OMS na década de 1980, após campanhas de vacinação realizadas em todos os continentes, conduzidas pelos governos locais e por organizações internacionais de saúde. Atualmente, exemplares do vírus são mantidos em laboratórios nos Estados Unidos e na Rússia para garantir a possibilidade de estudos retrospectivos sobre a doença.
O fundo Claudio Amaral, composto por registros da trajetória profissional do titular, aborda temas como a erradicação da varíola no contexto brasileiro, indiano e etíope e está disponível na base Arch (http://arch.coc.fiocruz.br/index.php/), da Casa de Oswaldo Cruz.
Para saber mais:
Fundo Cláudio Amaral – Departamento de Arquivo e Documentação – Casa de Oswaldo Cruz / Fiocruz
MUSEU DA VIDA – Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz. Exposição Revolta da Vacina. Disponível em: http://www.ccms.saude.gov.br/revolta/paineis.html
The Day of Shitala Devi. Disponível em: http://www.omashram.com/news/78-the-day-of-shitala-devi
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